sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

A Branca de Nada

by Betha M. Costa




Há muito tempo. Tanto tempo que ninguém mais lembra quando, em um povoado tão longe - que as pessoas já nem sabiam como sair de lá - vivia uma jovem chamada Branca. Tinha a pele torrada pelo sol, olhos castanhos sem brilho e cabelos negros-noites-sem-luar. Devido o trabalho pesado nos milharais suas mãos de dedos miúdos eram duas lixas aos toques. Seus vestidos esfarrapados, de tão remendados davam a idéia que ela estava sempre pronta para uma festa junina. Sem alegria e viço - ar de vela apagada - aparentava mais que seus dezoito anos.


Morava encostada na casa de camponeses que também trabalhavam para o senhor daquele mundão de terras. Como não tinha onde cair viva nem morta e por não saberem seu sobrenome todos a chamavam de Branca de Nada.


Branca podia não ter nada por fora. Mas, como as aparências enganam, a moça tinha muito por dentro: sonhos, criatividade, sensibilidade e inteligência.


De noite enquanto o povo se reunia em volta da fogueira para contar “causos”, no seu cantinho da casa, ela lia os livros que a filha do patrão lhe emprestava. Sim Branca sabia ler: aprendera quando bem menina com sua mãe antes que uma estrela a levasse para o céu.



Numa noite fria - dessas que se sente arrepios na alma sem que se descubra o motivo - um grupo de camponeses insatisfeitos e invejosos de não serem os donos daquelas terras planejaram um incêndio onde matariam o patrão, sua família e se apropriariam de tudo que era seu.


Branca tentou avisar seu Senhor através de sua filha, porém o homem era daquelas pessoas que se acham acima do bem e do mal e desdenhou daquela a que todos desprezavam...


Julgando-a louca mandou que a prendessem em um guarda - tudo distante da casa grande. Lugar tipo sótão, onde se guardam aquelas coisas que não se quer mais e que as lembranças não deixam que se jogue no lixo.


A moça lamentou que o patrão não acreditasse nela e como cada pessoa é dona de seu destino, deixou nas mãos dele o seu e foi cuidar do dela. Com sua inteligência privilegiada e naquele lugar cheio de coisas que uma pessoa lida e criativa como ela podia fazer juntou o que precisava: um cesto grande, cordas, muitos tecidos em velho fogareiro a óleo... Em pouco tempo havia construído um balão rudimentar para partir dali.


Na manhã do dia marcado para a rebelião Branca de Nada levou seu balão para um vale, arrumou tudo com perfeição e quando o ar quente do fogareiro subiu, o balão colorido das mais diferentes estampas muito bem costuradas ia tomando forma. Ao fim da tarde, munida de algumas frutas, água e muita coragem a moça entrou no balão, cortou com um facão a corda que o prendia a terra e alçou os céus.


Ao anoitecer, lá do alto, ela viu o povo camponês com tochas nas mãos incendiar a propriedade do seu antigo patrão e barulhos de tiros que mais pareciam foguetes saudando a sua liberdade. Branca de Nada agora era dona do mundo e se tornara Branca de Tudo, tudo que o com sua força e inteligência seria capaz de conquistar.

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