sexta-feira, 27 de maio de 2011

Paciente Terminal

by Betha M. Costa

Ah, bem feito que eu esteja ferrada!Ferrada e lúcida. Sem essa de ser piegas, ter olhos lacrimejantes... Dizer palavras bonitas aos familiares e amigos. Nada de perdoar os que me fizeram algum mal ou pedir perdão por tudo de ruim que fiz! Acesso de bondade no último minuto do segundo tempo da vida é o “ó do borogodó”!

Não fui nada que tentei ser. Falhei em todos os meus propósitos: fui filha mediana, aluna preguiçosa, amiga de poucos, esposa impaciente, mãe super-protetora profissional medíocre. Fui escritora oportunista e vivi de fé oscilante. Não adianta agora ser o que nunca fui. Enganar a quem? Agarrar nas mãos os rosários e boiar na bonança de uma religião que salve minha alma do Inferno? Putz! Duvido que exista lugar pior que o planeta Terra e seres mais ignóbeis que os ditos humanos.

Tudo que fazem por mim aqui é paliativo... Uma forma para que eu morra o mais confortável possível... Se é que morrer pode ser considerado confortável para alguém não quer a morte!...

Bolas! Ainda tenho tanto a não fazer! E estou deitada aqui a tragar com força esse fio de oxigênio que enfiam no meu nariz e a ouvir: parada cardíaca, o desfibrilador! Adrenalina, gente! 

Ai!Que choque!Isso doeu!Onde está o tal túnel com luz? Bem que eu não cria nele! Será que esse povo podia parar de gritar!Parece uma convenção de surdos. Eu morrendo e eles berrando. Como? Ninguém da família chora? Aiiiiiiiiii!Choque de novo: eu mereço! Cadê o túnel? Os anjos? Os amigos e parentes que já atravessaram o cortinado? Ah, o coração deu sinal de vida... Incompetentes: não perceberam! Uuuuuiiiiiii! Choque mais forte! Ih, parei de respirar!Que escurid...

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